“Tudo o que autenticamente humano aparece em Cristo!”
Esta é uma afirmação
básica da Cristologia sobre Jesus. Tomada a serio, deveremos reconhecer o que
se esconde por trás desta frase porque importa-nos perceber que no sofrimento
de Jesus, é Deus mesmo quem sofre a nossa dor. Daqui migramos para outro campo
e percebemos que a afirmação tão básica para a Cristologia se torna para muito
além de básica, profundamente libertadora. Esta se torna uma afirmação
libertadora porque temos em Jesus de Nazaré uma interação de Deus com sua
criação e com a própria vida tal qual ela é.
Jesus não está
escondido da vida, pelo contrário, está imerso em suas entranhas, enfrentando
sua aspereza como qualquer um de nós. Tomando decisões que modelam sua própria
existência entre os homens. Lança desafios aos que o escutam e se faz adversário
dos que detêm as rédeas da sociedade de seu tempo. Sobre estes adversários nos
interessa falar um pouco. Todo processo contrário a Jesus tem seu nascedouro
nos segmentos da religião de seu tempo. Religião é religar, unir dois pontos,
gerar harmonia entre o Deus Eterno e o homem pontífice de toda a criação! Jesus
percebe que a religião precisava ser religada! Sua pregação ao mesmo tempo em
que anuncia o Reinado de Deus desmascara a religião do seu tempo, e isto gera
oposição das lideranças religiosas, gera distanciamento do próprio povo. A Religião toca o imaginário das pessoas, toca
as representações de Deus de uma sociedade e consequentemente articulam uma
prática que deve ser condizente com a estrutura interpretativa da própria religião.
A religião é o meio institucionalizado de se tratar algo que é próprio
do ser humano, sua dimensão religiosa, ou com mais clareza, a abertura que o
homem possui ao eterno: seu espírito religioso. Que o homem é um ser religioso
podemos afirmar com segurança porque até então, não encontramos relatos de
nenhuma cultura humana que tenha sido ateia.
Imediatamente, uma
pergunta vem ao nosso encontro. E esta é um verdadeiro desafio tanto para a
razão humana quanto para a Fé, consiste em encontrar sentido para o nome Deus. Quando
pronunciamos este nome, qual o seu verdadeiro impacto e relevância sobre nossa
vida? A partir desta pergunta, perceberemos o que quis Jesus porque em muitas
situações o nosso deus (minúsculo de propósito!) é de fato o NOSSO deus, criado
à nossa imagem e semelhança, um deus que por ser projeção de nós mesmos não
passa de doença! Um deus doentio como muitos de nós, distante da dor e da realidade humana e por isso, a dor de
Jesus é vista simplesmente como pertencente a um ritual imposto de fora e de
cima! Esta divindade distorcida esmaga e suplanta a dor dos seus filhos,
fazendo-os acreditar que a remissão de toda dor acontece depois da morte. Os
adoradores de uma divindade deste tipo talvez não conheçam a negatividade por
trás desta imagem. O sofrimento e a miséria são vistos como punição pelo pecado
porque este deus não pode ser ofendido e tem que fazer pesar sua mão sobre os
homens.
Nesta visão
absolutista, deus só se aproxima, acolhe e ama quem se submete a ele! E ele deseja submissão, todavia, não olha a vida a partir de dentro. Por
isso, impõe sofrimentos, secas, fomes, doenças! De uma maneira mais
mercantilista, deus se põe a comercializar suas graças é o deus presente na impressão
de notas: deus seja louvado! O
deus daqueles que ganham dinheiro com o seu nome, impondo fardos sobre os
ombros do povo! Fazendo corresponder as bênçãos de deus com o dinheito que entra nas igrejas. Por aqui percebemos que esse deus tem a cara dos homens: egoísta,
orgulhoso e mesquinho! Esta visão equivocada de Deus faz com as pessoas achem
que como encontraram a deus, devem se distanciar deste mundo e de suas misérias e dos outros que são
simplesmente chamados de pecadores. Este deus nada tem a ver com o Deus Pai
anunciado por Jesus. Este deus, comparado com o Deus anunciado por Jesus é na
verdade, o Anti- Deus, ou Anti-divino!
A prática de Jesus nos
mostra uma visão totalmente diferente, absolutamente nova. Quando vemos o Deus
vivido e anunciado por Jesus somos lançados em um grande paradoxo porque de um
lado se encontra, o deus construído para nos aprisionar e do outro o Deus que é
Pai e que de tanto amar mergulha nos abismos da vida humana e nas suas mais
tristes contradições, toca o pecador sem medo de se contaminar, olha para o leproso e o cura, acolhe as crianças, abraça e perdoa os próprios inimigos. Sendo assim, mais importante que o culto é a justiça, o
amor e a misericórdia, porque o amor, misericórdia e justiça, envolvem o ser humano por dentro,
enquanto o culto pode ser simplesmente uma camuflagem de uma verdadeira
egolatria! Ou pior ainda, exteriorização e adoração ritual de sua falsa divindade humana. O centro das atividades e decisões não é a lei ou o sábado e sim o
ser humano! (Mc 2, 23-26). E a salvação de uma pessoa não depende do amor
exclusivo que ela tenha a Deus e sim pela forma como ela demonstrou este amor servindo ao próximo como um bom samaritano (Lc 10, 30-37) socorrendo os
empobrecidos deste mundo em suas necessidades porque cada sofrimento de seu
jeito e em sua complexidade é uma continuidade do sofrimento de Cristo (Mt 25,
31-46).
Jesus é Deus Conosco
porque Deus não é isolado ou fechado em si mesmo num amor trinitário egoísta, e
sim um amor tão grande e profundo que não se encerra no Pai e no Filho e no
Espírito Santo, abre-se ao mundo que ainda geme em dores de parto! Os homens e
mulheres que tenham fé em Jesus sabem que o amor a Deus é expresso no amor ao
próximo, e isto nos impede de viver sem perceber o sofrimento do mundo. A
Igreja de Jesus será e deve ser sempre uma Igreja de Con- crucificados por saber que
Deus não abandonou o mundo à sua própria sorte, mas acolheu todo o sofrimento
do mundo para que nada daquilo que sofremos seja estranho a Ele.
Esta imagem nova de
Deus apresentada na vida de Jesus é tão significativa que se torna mais
importante do que o desejo de guardar a própria vida, faz com que Ele viva não
preso em si mesmo e sim entregue ao mundo. Este desprendimento e entrega a Deus
faz com que os apegados a um deus que é projeção do ego humano, o vejam como ameaça
e o retirem da história. Jesus é vítima da dureza de coração, do egoísmo e da
maldade. Vítima do deus construído pelos homens e que não deseja livres e sim
escravos, que não fala em amor e sim em punição e extermínio de quem pensa ou
vive diferente. Jesus é um atentado a uma simbologia religiosa que não
serve para nada, pois não liga o homem a Deus nem os liga à sorte dos demais
membros da família humana. Ele é um desafiador de nossa consciência religiosa e
apresentação visível de que nossa prática religiosa, em muitas das vezes, não
nos aproxima do Deus verdadeiro porque quem pouco ama, pouco perdoa!
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