Celebramos
a Epifania do Senhor dentro do ciclo do Natal e o celebramos tendo como certeza
que naquela criança, Deus se fez manifesto aos homens. O Deus que habitava as
alturas de forma inacessível, cujo nome é impronunciável pelos homens é
apresentado ao mundo na fragilidade de uma criança. O que isto significa de
verdade? Para alguns, a criança é suplantada pela presença de Deus e a
humanidade de Jesus termina por ser negligenciada. Dizer que Jesus é a Epifania
de Deus é o mesmo que dizer que na humanidade de Jesus transparece para nós o que
há de mais divino. Em uma teologia mais rigorosa por termos, estamos falando da
união hipostática, ou seja, Jesus é plenamente Deus e plenamente homem e a
dualidade de naturezas é garantida pela unidade de pessoa. Embora esta seja a
linguagem real para a teologia é preciso tornar esta verdade mais acessível ao
nosso povo.
Epifania é um termo pouco conhecido pela maioria das
pessoas e é traduzido como aparição, manifestação. Pode
ser traduzida também como uma sensação profunda de realização no sentido de
compreender a essência das coisas, tudo que pode estar no âmago das coisas ou
das pessoas, isto é, poder considerar que a partir de agora se sente que
aconteceu uma iluminação mais decisiva, que permite sentir como claro,
nítido, pleno, algo que não se distinguia bem e que parecia mesmo difícil de
conseguir compreender. Em outras palavras, Deus se tornou acessível como nunca
antes: pela encarnação do Filho temos acesso ao divino e ao plenamente humano.
Ele expressa a verdade sobre Deus e sobre o homem. Embora seja celebrada em um
período do Ano Litúrgico, nunca poderemos nos esquivar da necessidade de viver
aquilo que celebramos, por isso, faz-se necessário utilizar a Festa da Epifania
do Senhor como uma baliza para entendermos o que se seguiu.
A Epifania não é algo do passado, muito menos encerrada na
infância de Jesus. Transpondo o tempo litúrgico perceberemos com fé sincera que
quando Jesus pronuncia palavras que nos mostram a beleza do mundo: olhai os lírios dos campos, eles não tecem,
eles não fiam, no entanto,eu vou afirmo que nem mesmo Salomão com toda sua
pompa, jamais se vestiu como um deles se veste! (Lc 12, 27), estamos diante
de uma manifestação do sentido da realidade exposta por aquele que é Deus
conosco, neste sentido percebemos que Epifania fala de Deus e também do sentido
do mundo! Quando Jesus expulsa os mercadores do sagrado presentes no templo
temos uma epifania de Deus que não tolera comércio com seu nome e ainda os
chama de ladrões!
Mesmo em um momento sombrio como
expressa o Evangelho “Nisto surgiu uma grande tormenta e lançava
as ondas dentro da barca, de modo que ela já se enchia de água. Jesus achava-se
na popa, dormindo sobre um travesseiro.” (Mc 4,37-38). Temos uma expressão
de quem é Deus em meio aos desafios do mundo. Em tudo na vida de Jesus portanto,
veremos uma Epifania de Deus: acolhe os pecadores e faz refeição com eles para mostrar que Deus
é misericordioso (Lc 15, 1-2). Perdoa os pecados mas impõe uma consciência acerca
do pecado porque Deus deseja a vida do pecador e o fim do pecado (Jo 8). E nos últimos
momentos, enfrenta o sofrimento com coragem para revelar o triunfo de Deus
sobre o pecado e a morte.
Em Jesus Deus se torna transparente
para o mundo, não há barreiras ou distâncias, Deus nos fala abertamente.
Revela-se a si mesmo, mergulhando no que é nosso para gerar comunhão entre nós
e Ele, Jesus é assim o encontro entre dois mundos, o de Deus o nosso! Deus emerge
dentro do mundo por meio de Jesus, então a Epifania, manifestação é expressa de
forma diafânica, ou seja, de dentro da história de Jesus e Jesus não é uma
pessoa abstrata, um alienígena que caiu de repente na história dos homens. Ele está
situado em um tempo, em um território, em uma cultura, em uma vida portadora de
limites e fragilidades! A pergunta quem é Deus é respondida a partir de dentro
do próprio mundo que se tornou morada para o Filho Eterno, neste sentido é que
Ele nos mostra o rosto jamais visto do divino (Jo 1, 18)
Sendo assim, o mundo não pode ser
visto como demonizado e separado de Deus e os cristãos embora não sejam do
mundo, não serão tirados dele, serão guardados enquanto caminham nele! (Jo 17).
Em meio às trevas do mundo, vemos brilhar uma luz e esta luz ilumina cada vida,
e nossa vida se torna lugar de onde Deus deseja emergir para fazer acessível a
todos. Por isso, o cristão é um sacramento de Cristo para o mundo. Como sacramento
deve ser sinal da reconciliação, da paz, da concórdia, da busca da justiça, da
superação da intolerância e de socorro aos fragilizados. Só a partir desta
ótica se torna manifesto para nós o sentido de Mateus 25, 31-46. Quando
fizestes a um destes pequeninos foi a mim que o fizestes. Ver Jesus
transparecer na vida dos outros e na nossa é encontrar em meio às trevas do
mundo uma luz.
O mundo está escuro, a escuridão do
mundo se deve a poderes maldosos postos em atividades não por Deus e sim pelo
próprio homem, estas forças são a alienação religiosa contra a qual se opôs Jesus,
o descaso político, as manipulações e joguetes políticos feitos com a vida do
povo simples que já não tem direito a nada, a infantilização das relações que não
permite a emancipação das pessoas, a manipulação tendenciosa de informações que
criam discórdias e exclusões. Mesmo em meio a isto, o mundo não está perdido e
quanto mais forte for o brilho de Cristo na vida de alguém mais nítida será a
realidade de enraizamento desta mesma pessoa no mundo porque só assim se vive
coerentemente o Evangelho, não na conformidade com o mundo ou na fuga do mesmo
e sim na busca de sua transformação. Crer em Jesus e não buscar mudar a
realidade na qual se vive é trair o mesmo Jesus. Caminhamos diariamente entre
trevas e luzes. As trevas do nosso comodismo e da nossa indiferença que nos
impedem de ver no outro o próprio Jesus. Vivemos entre luzes também porque Deus
sempre presente na história continua a manifestar sua vontade nos homens e
mulheres de boa vontade que não se cansam de buscar uma sociedade mais justa e
fraterna e que procuram viver a sua fé como serviço a Cristo nos crucificados
de nosso tempo!
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