A cruz é o símbolo católico do Cristianismo. Segundo publicitários, a
mais simples e genial logomarca já criada: dois pedaços de pau cruzados
ou apenas dois riscos perpendiculares gravados na parede, ou ainda dois
dedos colados, uma na vertical e outro na horizontal.
Há um paradoxo pois a confissão religiosa que celebra a vida como dom
maior de Deus adote como símbolo um instrumento de morte. Cruzes são
encontradas nos cemitérios, nas tumbas. Não é o caso de Jesus de Nazaré,
que deixou vazio o túmulo de pedra. Sua morte não o fato central da Fé
cristã. O fato central é sua gloriosa Ressurreição do meio dos mortos.
Como dizia São Paulo, não houvesse Jesus ressuscitados dos mortos, a
nossa fé seria vã! (1 Cor 15,14) O desafio então que se impõe passou
despercebido aos olhos dos teólogos. Perguntamos então: como é possível
simbolizar a Ressurreição? Porque se o centro da Fé Cristã não é a morte
e sim a Ressurreição, que outros sinais poderiam representar o triunfo
de Jesus sobre as forças tenebrosas da morte?
Até hoje não encontrei ninguém que fosse criativo o suficiente para
consegui-lo. Na Igreja Primitiva era o peixe o símbolo secreto da Fé
cristã, em referência ao Batismo. Assim como os peixes vivem nas
profundezas do mar, dos rios e dos lagos, os cristãos mergulhados nas
catacumbas, onde foram encontradas várias pinturas de peixes, renasciam
pela água batismal. Para Santo Agostinho, Cristo é o Peixe vivo no
abismo da mortalidade, como em águas profundas (Cidade de Deus, XVIII,
23). Além disso, peixe em grego era acróstico de Jesus Cristo Filho do
Deus Salvador.
Foi a perseguição romana que induziu as comunidades a adotar a cruz,
instrumento de suplício e morte do Império. Nela Jesus foi sacrificado. A
mais antiga cruz que se conhece data do século IV e está gravada no
portal da Igreja de Santa Sabina, em Roma, no monte Aventino, anexa ao
convento que abriga o governo geral da Ordem dos Dominicanos. Cessada
perseguição à Igreja, a cruz passou da clandestinidade para a
centralidade nas torres dos Templos. E, aos poucos, tornou-se o eixo
simbólico do Cristianismo. A ponto de a Via Sacra, antes da Reforma
Litúrgica promovida pelo Concílio Vaticano II, contar com apenas 14
estações. Hoje nos livretos, encontramos 15 e assim a Ressurreição de
Jesus é expressa como o ponto culminante dessa forma de devoção cristã.
A predominância da cruz incutiu no catolicismo uma espiritualidade
lúgubre. Não por acaso os sacerdotes se vistam de preto. O riso, a
alegria, as cores, pareciam banidos da Liturgia. Enfatiza-se mais a
morte de Jesus pela redenção de nossos pecados correndo o risco de
esquecer a ressurreição como vitória da vida, de Deus sobre os poderes
da morte. Sempre se correu o risco de super valorizar a dor em lugar do
amor. Para a pergunta feita sobre como simbolizar a Ressurreição
respondemos que por meio de algo que represente a vida. Sinceramente,
não conheço nada melhor do que o Pão. Ao que parece, temos isto na Ceia
de Jesus, na Oração que Jesus ensinou, nos gestos da partilha e da
comunhão. O pão é um alimento universal, encontrado em quase todos os
povos ao longo da história. Por falar na relação entre Jesus e o Pão,
lembremos o Evangelho de São João:
"Eu sou o Pão da Vida!" (Jo 6, 48). A escolha do Pão é porque o Pão
representa todos os alimentos. E a vida como fenômeno biológico subsiste
graças à comida e à bebida. São os únicos bens materiais que não podem
faltar jamais ao ser humano pois sua falta representam a morte. No
entanto, é vergonhoso constatar que hoje mais de 1 bilhão de pessoas
vivem no mundo, em estado de desnutrição crônica. Isso em países
cristãos, muçulmanos, budistas. Para que serve uma religião cujos fiéis
não se sensibilizam com a fome alheia? Por que tanta indiferença diante
dos povos famintos? O que significa adorar a Deus se ficamos de costas
ao próximo que padece de fome? (1Jo 3, 17).
Jesus fez a partilha do pão e do vinho, da comida e da bebida, o
sacramento central da comunidade de seus discípulos - A Eucaristia.
Ensinou que repartir o Pão é partilhar Deus. A partilha do pão é a marca
de toda a militância de Jesus (Lc 6, 21). A comensalidade era a
expressão vivencial mais característica de sua espiritualidade, para a
qual havia uma íntima relação entre o Pai (amor de Deus e a Deus) e o
Pão (o amor ao próximo). A oração de Jesus articula bem essa relação.
Deus só pode ser chamado de Pai Nosso se também o Pão não for só meu mas
nosso, de todos. Por esta relação se justifica a ausência de
preconceitos em Jesus e sua facilidade de se sentar à mesa com os
pecadores e publicanos ainda que isto lhe valesse a fama de comilão e
beberrão. (Lc 7, 34). Partir o Pão era algo tão característico de Jesus
que os discípulos de Emaús o identificassem (Lc 24, 30). E a Ceia se
tornou o sacramento por excelência da presença e da memória de Jesus (Mc
14, 22ss).
O Pão, eis o símbolo mais expressivo da prática de Jesus, a ponto de
transubstanciá-lo em seu corpo. E todo Pão se oferece ao faminto tem um
caráter sacramentental (Mt 25, 31-46). Ali é ao próprio Jesus que se
oferece. Às vésperas de sua morte, Jesus nos antecipou a sua
Ressurreição ao dividir com seus discípulos, na ceia, o pão e o vinho.
Ele se deu a nós. No gesto de Justiça, ao partilhar o Pão nós nos damos a
ele. Eis o sentido Evangélico da Comunidade, da comunhão. È o que
retrata a Parábola do Pai misericordioso, na qual o perdão ao filho que
se perdeu no mundo e retorna é celebrado em torno da comida.
Pão: bem essencial à vida, dom maior de Deus, que se fez carne e se fez
pão, o que levou Jesus a afirmar: "O Pão que eu darei é a minha carne
dada para a vida do mundo." (Jo 6, 51). Se já não temos entre nós a
presença visível de Jesus, ao menos adotemos como sinal de sua presença,
isto que ele mesmo escolheu na Última Ceia: o Pão. Sinal de que somos
também discípulos, empenhados em tornar realidade para todos "o pão
nosso de cada dia", os bens que imprimem saúde, dignidade e felicidade à
nossa existência.
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