domingo, 26 de fevereiro de 2012

Plano de Ação Pastoral Paroquial (PAPPa) - Documento Oficial

c. CORPO MÍSTICO DE CRISTO



A Igreja é convocada para ser corpo de Cristo, para manifestar como sacramento o valor místico do corpo, uma Igreja que é corpo social por ser Povo de Deus, uma Igreja fundada por Cristo a partir de sua Pessoa e de seus mistérios.

Até o começo da Idade Média entendia-se por corpo místico a eucaristia, sendo a Igreja chamada de ‘corpus verum’ (corpo verdadeiro) sendo que no século XIII as correspondências se inverteram. A expressão ‘corpo místico’ encontra-se pela primeira vez no Magistério na bula ‘Unam Sanctam’ (Una e Santa) de Bonifácio VIII em 1312.  Na Idade moderna, a expressão ‘corpo místico’ foi abandonada, pois parecia favorecer os protestantes em sua concepção de uma Igreja puramente espiritual e invisível, oposta à Igreja instituição, corpo social e jurídico.

 Comparar um grupo social a um corpo é uma analogia espontânea e portanto universal, mas a compreensão cristã é original, derivada da novidade da obra de Cristo.

No cristianismo a visão não é cosmológica, nem sociológica e nem física, mas histórica e sobrenatural, por ser ligada à ação histórica de Jesus enviado pelo Pai em vista de uma nova criação.

Deve-se a São Paulo essa compreensão da Igreja. Já o próprio Jesus introduzira uma imagem análoga, de tipo vegetal e não antropológico, a videira e os ramos (Jo 15).



As 18  passagens paulinas – segundo um certo critério de análise - podem ser reunidas em dois grupos, um primeiro presente sobretudo nas grandes cartas e o segundo nas cartas do cativeiro:

- No primeiro grupo o Cristo é a totalidade do corpo do qual somos membros, ou a Igreja é a totalidade visível do Cristo presente nela de modo invisível:

1Cor 12, 12-27  (corpo de Cristo);  Rm 12, 4-8  (corpo em Cristo);

1Cor 1,13; 6,15-17; 10,16s; Gl 3,28; 4,19.

Nas cartas do cativeiro:  Ef 4, 4.12s.25; Cl 1, 24; 3,11.15.

Igreja corpo de Cristo é a comunidade local, qual organismo vivo, exortada a cultivar a diversidade dos carismas como expressão da unidade, através do serviço mútuo da caridade. O realismo do corpo aparece nas expressões: “formamos um só corpo em Cristo”, e não “formamos um só corpo como Igreja’; ainda: “assim acontece com Cristo”, e não “assim acontece com a Igreja”; ainda: “estaria o Cristo dividido?” (1Cor 1,13), e não “estaria a comunidade dividida?”. A imagem é inspirada na eucaristia e no batismo.

                 

-  No segundo grupo  o Cristo é apresentado como a cabeça do corpo do qual somos os membros:

 Ef 1, 22-23; 2,16; 4,15s; 5,23.29s; Cl 1,18-20.24; 2,17-19.

Corpo de Cristo é a Igreja universal, cuja atuação envolve também o cosmos, pois o Cristo é Cabeça também das potências cósmicas e da humanidade inteira, não só da Igreja. Mas se Cristo é Cabeça do universo, sua  Igreja é seu corpo, e através desse corpo Cristo exerce seu influxo universal. Daí a missão da Igreja não só de manter a unidade interna, mas também de ser força de reconciliação entre todos os homens. A imagem é inspirada na Cruz de Cristo.

‘Cabeça’, representa o mais elevado, o melhor, o comando, a autoridade, a proeminência, enquanto que, do ponto de vista grego, o princípio do qual emana o fluxo vital.

Como temas análogos encontramos em Paulo:

- o tema da recapitulação: Ef 10;

- e do ‘pleroma’, que significa  plenitude: Ef 1,19.22s ; 3,19; 4,13 ; Cl 1,19 ; 2,9s; (cf. Jo 1,16).

      Pleroma é o que tudo preenche: A Palavra preenche o mundo, o Cristo preenche a Igreja. Pleroma diz respeito ao mundo como um todo, corpo diz respeito às pessoas.  Neste último caso há três interpretações possíveis:

- A Igreja completa o Cristo; Ela dá à Cabeça o que esta não tem por si só (sentido passivo);

- O Cristo completa a Igreja, pois esta sem Ele nada é, é esvaziada de sua substância (ativo);

Cristo confere à Igreja, seu corpo, um dinamismo de crescimento até atingir a maturidade da Cabeça (Ef 4,13);

- O Cristo se completa através da Igreja: a Igreja não existiria sem o Cristo; o Cristo não poderia exercer sua missão sem a Igreja e por isso a fundou e a ligou a si (sentido médio).

Como cabeça, corpo e plenitude, Cristo recapitula, isto é, concentra, resume tudo, Deus e o  homem, a realidade material e espiritual, o passado e o futuro, o Antigo e o Novo Testamento, o princípio e o fim da história, Ele é o Alpha, o Omega e o eixo central. Dele tudo deriva para os fiéis serem parte viva do seu corpo. Corpo físico é o Cristo terreno, o Cristo glorioso e o Cristo eucarístico. Corpo místico é a Igreja do ponto de vista da fé. Corpo moral ou social ou jurídico é a Igreja do ponto de vista da razão.

A Tradição desenvolveu mais o tema com a doutrina da Igreja Corpo da Trindade e do Espírito Santo,  alma da Igreja, corpo de Cristo.

Se cada indivíduo é uma pessoa física, se falamos de pessoa jurídica e de pessoa conjugal, a Igreja é pessoa mística.

A imagem do corpo traduz a idéia de um organismo vivo, com ligações e articulações internas e estreitas, uma vida que vem de dentro, com diversidade complexa e enriquecedora na pluralidade de membros e funções, indicando as várias e insondáveis maneiras de ser cristão. Os membros, por sua vez, por quanto saudáveis e preciosos, permanecem vivos só se souberem se manter na unidade vital do corpo inteiro. Por outro lado, um órgão enfermo se mantém vivo se integrado ao corpo.

A Igreja não é acrescentada ao Cristo, mas surge dele, é unificada vitalmente por ele a partir de dentro. Jesus pensou uma continuidade de sua obra de uma forma que não dependesse por demais só da liberdade humana, pois a unidade do corpo prevalece sobre todas as divisões (o corpo não pode se desfazer dos membros e os que se dividem mantêm sempre um laço), não é perturbada pelas diferenças e variedades, antes é enriquecida.

 O adjetivo ‘místico’ acrescentado a ‘corpo’ serve para distingui-lo do físico em geral, onde os membros e órgãos visam tão somente o bem do conjunto e não o bem da cada órgão-pessoa. Distingue-se também do corpo físico de Jesus, terreno e glorioso. A associação do corpo físico e do corpo místico forma o Cristo total.

O adjetivo ‘místico’ não se encontra nas cartas paulinas, mas ele é condizente com a visão do apóstolo sobre o Mistério, isto é, o plano de salvação que organiza todas as obras de Deus, assim como a missão do Filho e do Espírito. De fato, “místico” é o adjetivo de mistério. Em conseqüência, o adjetivo ‘místico’ não qualifica esse corpo como impreciso, indeterminado, imaginoso, misterioso em sentido vago, metafórico, uma pálida imagem do real e físico, mas qualifica o corpo da Igreja por sua pertença à realidade do mistério, do projeto de Deus para o futuro definitivo da humanidade.

Trata-se de um corpo real e verdadeiro, embora não reduzido ao aspecto físico e visível. Por ser corpo ‘místico’:

- os membros estão unidos imediatamente e diretamente ao Cristo ressuscitado;

- é objeto de fé, não alcançado adequadamente pelas ciências;

- distinto do corpo como unidade social, jurídica, moral, política, psicológica;

- é o corpo ideal, definitivo, como Deus pensou e a partir do qual existem os corpo físicos;

- o cosmos por si só não é o grande corpo dirigido pelo Lógos, como pensavam os estóicos;

- o corpo de Cristo, seu instrumento de ação, não é o céu, os anjos, as energias físicas, a mente, a humanidade, mas exatamente a Igreja;

- corpo místico é o visível unido ao invisível na Igreja, não só um dos dois aspectos; o Cristo não é a parte invisível do visível, pois a Igreja por ser de Cristo é em si mesma visível e invisível;

- por sermos membros do corpo, somos e vivemos muito mais de quanto a consciência capta.



Na atual separação de igrejas, qual a relação entre o corpo místico e as várias igrejas? A redação final da Lumen Gentium 8, após amplas discussões, optou pela fórmula: “Esta Igreja, constituída e organizada neste mundo como uma sociedade, subsiste na Igreja Católica...embora se encontrem, fora de sua estrutura visível, vários elementos de santificação e de verdade.” Portanto, a Igreja de Cristo, como seu corpo místico, se realiza plenamente na Igreja Católica, mas se encontra de um modo incompleto e imperfeito em outras comunidades cristãs. A verdadeira Igreja de Cristo toma formas concretas e visíveis, salva e santifica.









d. ESPOSA DE CRISTO



         Tal denominação não é hoje muito valorizada, pois parece meramente metafórica, sem consistência teológica, até mesmo sentimental, edulcorada, inadequada para a nossa sensibilidade. A isso se soma a tendência a separar e distinguir Jesus  da Igreja mais do que a uni-los, a resistência a acentuar a continuidade entre os dois, preferindo-se explorar a descontinuidade.

            A imagem da esposa acentua a íntima união da Igreja com Cristo e ao mesmo tempo a sua distinção e personalidade própria, aspecto que permanece velado na imagem do corpo.

No Antigo Testamento Deus se apresenta como o Esposo do seu Povo: Os 1,2 -3,5;   Jr 2, 1-7; 3; 31,22; Is 54, 1-10; Ez 16; 23; Ct.  Deus é esposo porque ama, não por conveniência de obter filhos, companheira, braços para o trabalho. Deus ama independentemente da infidelidade da esposa, com um amor capaz de perdoar, de vencer a infidelidade, de reconquistar o amor. A vergonha da esposa se torna a vergonha de Deus, por isso ele a assume e cancela. Deus torna a esposa bela e fecunda, porque a ama, não a ama porque bela: Is 62,2-5; Sl 44. Assim, a forma mais terrena e carnal, a mais frágil e mais sujeita ao pecado é que se torna imagem do amor de Deus.

            Ser esposo era título divino. Jesus se apresenta como esposo: Mt 9, 14s; 22, 2s; 25,1; Mc 2,19; Jo 2, 1-12; 3,29. A sua presença traz alegria e motiva a festa; sua ausência traz tristeza e motiva o jejum.

            O tema é explorado por Paulo: 1 Cor 6, 15-17; 2Co 11,2; Ef 5, 21-33. Este último texto é particularmente rico. Paulo trata ao mesmo tempo de três realidades: relação entre Adão e Eva, entre marido e mulher, entre Cristo e a Igreja. Essa visão é então projetada sobre Gênesis 2,18-24.

Trata-se de um mistério, neste caso especialmente, de uma realidade admirável que não conseguimos analisar adequadamente. O motivo da surpresa é a combinação entre a união e a diferença, a identidade e a distinção. É a surpresa alegre de Adão ao exclamar diante do inesperado: “Esta sim, é osso dos meus ossos e carne da minha carne!”.  A Igreja, por um lado, é o corpo de Cristo, por outro é outro corpo, o da Esposa, pessoa dependente que atinge sua maturidade através da dependência; mas também são dois numa só carne. São iguais e diferentes, são um só e são dois.

 Assim como Adão é incompleto e se sente só sem Eva, assim o Cristo Jesus sem a Igreja. Manifesta-se, pois, na relação entre Cristo e a Igreja a própria relação entre o Filho e o Pai segundo a qual um não pode existir sem o outro (Jo 17, 21-23). A Igreja, todavia, não é gerada por Cristo, mas é criada do seu lado, como Eva de Adão, é unida a ele não por geração, mas por união esponsal. Como ensinaram os Padres da Igreja,  a esposa nasce do lado aberto do novo Adão que, na cruz, dorme o sono da morte.

Eva é criada já como esposa e foi dada a Adão como auxiliar a ele semelhante, não como ‘fêmea’; assim a Igreja não tem a mesma função de Jesus, mas uma que lhe corresponde: o que ela tem de diferente combina com Jesus e acrescenta algo a Jesus. Eles são uma só carne: Jesus foi encarnado de certa forma incompleto, mas porque estava previsto que ele se completaria na e com a Esposa.  O ‘nós’ não é a soma do ‘eu’ e do ‘tu’, não é a coincidência de semelhanças prévias, mas é a frutificação do encontro entre o ‘eu’ e o ‘tu’. O ‘nós’ gramatical não é o ‘nós’ teológico, por isso Jesus esposo da Igreja é mais do que a soma dos dois, é o que Jesus só consegue ser e fazer porque  se uniu à esposa. Assim, Adão sentia-se só sem Eva, apesar da companhia dos animais e da intimidade com o próprio Deus.

            Pode-se distinguir várias fases nas núpcias do Cordeiro:

A Encarnação é a escolha do noivo pelo Pai para o seu  povo Israel;

As Bodas de Cana são a apresentação do Noivo e dos seus presentes;

A paixão e a morte são a prova do amor e a dor do parto que gera a noiva;

A ressurreição e Pentecostes são o dote do noivo;

A Parusia é a festa, o banquete nupcial (2Cor 11,2; Ap 19,7s; 21,2.9; 22,17).



Ao se distinguir o matrimônio celeste do noivado na terra, se quer acentuar que  na terra a Igreja nunca consegue se adaptar em tudo ao desejo do Esposo nem desvendar plenamente o seu mistério. A ‘uma só carne’ foi transfigurada pelo Espírito somente no Esposo, e é a santidade dele que supre pelas infidelidades dela.

A Igreja que é noiva, esposa, é feita também Mãe pelo Esposo. Regenerada do pecado, ela se torna Mãe virgem, em Maria no sentido real, na totalidade da Igreja no sentido ideal. A Igreja é esposa fecunda “ex auditu”, ao conceber pela semente da Palavra acolhida no coração.

O amor para a Igreja nasce espontâneo em quem tem fé, não só porque somos a Igreja como Corpo de Cristo, mas também porque a Igreja é a Esposa, amada por causa do Esposo e não só por ela mesma. Por isso, não é indispensável que a Igreja, para quem tem fé, mostre que merece amor pela sua atuação, qualidades e desempenho, pois o motivo principal lhe vem da sua relação esponsal com o Cristo. Desprezar a Esposa fere a honra do Esposo. A Esposa, mesmo feia e inconveniente, em determinados momentos da história, é respeitada e amada por causa do amor do Esposo.

Expressões usadas por pregadores de outrora como “casta meretriz”, exprimem a indignação pela infidelidade de tantos membros da Igreja, mas não a natureza e o destino da Igreja



e. TEMPLO DE DEUS



            Se corpo supunha uma distinção entre cabeça e membros, se Esposo apela para o correlativo Esposa, Templo é um título que se aplica igualmente a Cristo e à sua Igreja.

            Hoje não nos damos conta do grande significado do Templo para os judeus. Para podermos avaliar o alcance da atribuição a Cristo e à Igreja e a continuidade criativa entre Israel e a nova visão cristã, é indispensável que tentemos reconstruir essa concepção.

            O Templo constituía o sinal sensível da presença de Deus no meio do seu povo, o lugar do culto sacrifical, da oração eficaz e da experiência da intimidade com Deus (cfr salmos), e enfim o sinal e a garantia da unidade e da identidade do povo eleito, o sinal da unidade do mundo, da unidade entre o céu e a terra. Toda a liturgia tinha por fim alimentar sensivelmente essa concepção.

            Jeremias previu a destruição do Templo devido à formalização do culto que criava uma falsa segurança dispensando da adesão interior à Lei; devido ao desprezo pela prática da justiça social; devido à complacência com a idolatria em aliança com povos estrangeiros, devido à sua instrumentalização para fins de poder, prestígio e enriquecimento.

            Outra tendência foi a idealização do Templo, como em Zc 14,21, ou em Ez 40, onde a experiência da presença de Deus se faz através de uma reconstrução imaginária, num santuário não feito por mãos humanas. Quando existe o Templo, afirma-se que cumpre perfeitamente a sua missão, espera-se que comunique por ele mesmo a comunhão com Deus (Salmos), prevê-se um Templo perfeito no futuro messiânico. Quando não há mais Templo, recorre-se à representação mental, busca-se uma experiência mística através do arquétipo celeste.

            Deu-se também um processo de espiritualização do Templo, na convicção que Deus habita no humilde e piedoso, ou então no mundo inteiro, ou mesmo na Torá. Os fariseus afirmavam que o Templo é uma vida pura, enquanto que essênios e batistas se afastavam do Templo, horrorizados com a corrupção nele reinante.

Jesus ensina (Lc 19,47) e ora no Templo, não reivindica funções sacerdotais, venera o Templo e apela para o seu significado original (Mt 21,13; Lc 19,46, Mc 11,17), chamando-o de casa de seu Pai. Todavia, prevê  com tristeza a sua destruição (Mt 23, 38; 24,2), o que se torna um argumento deturpado e usado contra ele no processo diante do Sinédrio (Mt 26, 61; 27,40; Mc 14,58).

             Jesus prevê a superação do Templo (Jo 4, 20-24), pois Ele é maior do que o Templo (Mt 12,6), aliás Ele é o próprio Templo (Jo 2, 18-22), pois através dele o Verbo armou sua tenda no meio do povo (Jo 1,14.51; 7, 37-39; 19,34; Cl 1,18s). Ao voltar ao Pai, Jesus entra no Templo celeste, modelo do terrestre (Hb 6,19s; 8,1-5; 9,1-14.23ss; 10,19s).

            Jesus supera o Templo porque realiza o seu significado de um modo superior, além ainda da espiritualização e da idealização dos profetas e dos piedosos. Jesus é o Templo por identidade, não só por representação, vivendo a pericórese trinitária no seu corpo. Ele é o sacerdote e o altar, tendo penetrado no arquétipo celeste, onde intercede por nós; através dele a nossa oração é ouvida pelo Pai. Ele reúne as ovelhas que une ao seu corpo pela eucaristia, fazendo-nos extensão do Templo que Ele é, numa nova solidariedade. Ele realiza a promessa do Templo para todas as nações (Mc 11,17). Ele é a identidade do povo que por causa do seu nome é chamado de ‘cristão’.

Sem que haja contradição nem incoerência, pois se trata de metáforas, o Cristo e também nós somos o Templo, mas somente Jesus é a pedra angular (Mt 21, 42; Ef 2,20; 1Pd 2,4-8 BJ) e Pedro a rocha da Igreja. Jesus é o Templo, parte do Templo, a plenitude do Templo que vai edificando. Templo é a Igreja e cada fiel. Em Ef 2,14-22 se passa da imagem do corpo para a imagem do Templo. Cristo é ainda o plano ou o Templo eterno e celeste que inspira todas as realizações divinas na história e ainda a meta para a qual se dirige toda realização.

            Jesus faz reverter o seu modo perfeito de ser o Templo de Deus para sua comunidade, a Igreja, a ‘minha Igreja’, como a denomina. Embora ‘Ecclesia’ indique a comunidade em assembléia, Jesus a ela se refere como sendo uma construção com portas e chaves, fundada sobre uma rocha, sobre a qual ele vai edificar (Mt 16, 18-19). A linguagem de Jesus refere-se a uma Igreja que é casa, Templo e cidade. Há aqui evidentemente uma combinação da imagem da assembléia com a imagem do Templo de Jerusalém. De fato, esperava-se um Messias que iría restituir o Templo ao seu máximo esplendor e nele reunir os dispersos de Israel (Is 49, 17-22). É esse clima de expectativa que dá sentido à ‘minha Igreja’ de Jesus. Todavia,  Jesus não estabelece a nova Aliança sobre uma construção, mas sobre pessoas vivas que passam assim a ser o seu Templo, o Templo que ele edifica como Messias. Jesus já reivindicara o recinto do Templo para a oração dos pagãos (Mc 11,17); a cortina rasgada no Santuário  (Mt 27,51 BJ) assinala a abertura do Templo para todos, o que se fará com a Igreja após Pentecostes.

Agora, é a própria comunidade dos fiéis o lugar da presença de Deus, atraindo para si todas as atribuições do Templo (Mt 18; Jo 14,23; 1Cor 3,16s; 6,19; 2Cor 6,16; Ef 2,19-22; 1Pd 2,4-8; Ap 3,12). Como o corpo glorioso de Cristo é cheio do Espírito Santo, a Igreja é o Templo do Espírito. Os cristãos oferecem na vida o seu culto espiritual (Rm 12,1s).

            A Igreja futura corresponde não só ao Templo definitivo, igual ao Templo celeste, mas também à nova Jerusalém, à nova Sião (Ap 21-22).

            Tudo o que é próprio da atividade da Igreja e para a Igreja é denominado de ‘edificante’: assim especialmente a Palavra (At 20,32; Jd 20; Rm 15,20; 1Co 8,1; 10,23; 1Ts 5,11).

            Nós cristãos, não perdemos o Templo, o sacerdócio e os sacrifícios como os judeus, mas temos um que não depende dos homens para agradar a Deus e cumprir com perfeição as suas funções, um Templo que agora se tornou realmente uma síntese do universo e que está em todos os lugares (Jo 4, 23), um Templo que não só freqüentamos, pois dele participamos.

A Igreja é Templo do Espírito Santo, assim como este é a alma do Corpo. O Templo de Jerusalém ficou cheio da nuvem no dia da consagração (1Rs 8, 10-13; Ex 13,22 BJ), a mesma que envolveu o Cristo transfigurado. O Espírito, dom do Cristo ressuscitado (Jo 14, 26), confere unidade, conexão das partes, e vitalidade, exercício adequado das funções.



f. IGREJA COMUNHÃO



            A profissão de fé pode ser interpretada da seguinte maneira: “Creio no Espírito Santo, que faz santa e católica a Igreja e a torna comunhão de santos”. A expressão ‘comunhão dos santos’ trata-se de uma afirmação coerente com uma Igreja definida como Povo da Aliança, Corpo de Cristo e Templo de Deus, uma Igreja que então será una e católica, como se tratará mais adiante.

A Igreja como comunhão dos santos é a manifestação, a participação e a comunicação da pericórese (comunhão) trinitária. Se as Pessoas divinas só existem como Trindade, a pessoa humana tem por vocação existir como comunidade que continua a Trindade. A unidade e pluralidade divinas são o quadro ideal, o protótipo, a imagem primordial da relação entre indivíduo e coletividade, que, na medida em que se aproxima da referência trinitária, constitui uma comunidade.  A índole social do homem não é tão somente reflexo da sua pobreza, mas é a expressão da plenitude da Trindade, a cuja participação o homem é vocacionado. A pobreza degradante está na dificuldade de reconhecer e realizar a índole social cristã.

Em virtude da comunhão, a comunidade pode se resumir num único representante (personalidade representativa) e pode ser expressão de um membro particular (personalidade corporativa). Evidentemente, é isso o próprio de Jesus Cristo, mas por causa dele, também de outras pessoas com alguma missão específica para o proveito comum. Do ponto de vista de vivência interior, cada membro da Igreja pode sentir como seus, incorporados na sua consciência e processo vital, todos os bens, as infidelidades e as tribulações da Igreja. A individualidade pessoal de cada membro da Igreja, não é, portanto, somente parte do todo como se este fosse um mecanismo, mas até mais do que em um organismo. Os bens e conquistas dos mais santos fazem a alegria e a esperança dos menos santos.



A comunhão dos santos diz respeito a todos os fiéis, em todos os tempos, em todos os momentos da extensão total de sua vida, forma a Igreja a partir de Abel.  A comunhão é assim a conexão, a comunicação interna, espiritual, que une todos os fiéis das três esferas da Igreja (igreja militante que somos nós, igreja padecente, os que estão no purgatório e igreja celeste, os que estão nos céus) como membros de um mesmo Corpo místico e lhes dá a participação mútua dos mesmos bens. Assim é que os anjos se alegram pela conversão do pecador (Lc 15,10), o Senhor é louvado pelos que estão no céu, na terra e sob a terra (Fl 2,10s).

Esses bens circulam entre os fiéis em forma de mérito pelos atos de virtude (exemplos, testemunho, carismas, orações) e em forma de satisfação pelos pecados (penitências, intercessão, indulgências, sufrágios). Há também formas extraordinárias (pela menor freqüência e pela não imprescindibilidade), como aparições, experiências de presença e de intercessão. É a comunhão dos santos que justifica o culto às relíquias e às imagens, assim como a espiritualidade da imitação dos santos. Essa comunhão é mística, situa-se no nível profundo do ser, mas dá origem a expressões conscientes e intencionais que a alimentam.

Existe, na santidade oculta na Igreja, uma riqueza sempre transbordante onde podem haurir todos os pobres; por outro lado, ela coloca nas mãos dos pequenos uma alavanca para levantar o mundo. Os fiéis peregrinantes podem olhar para o elenco dos santos da glória como para um álbum de família, uma árvore genealógica, invocando-os com amor e esperança, com espírito de corpo.

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