1 e 2 TESSALONICENSES
1. A cidade de Tessalônica
Tessalônica foi fundada em 315
aC por Cassandro, general de Alexandre Magno, no lugar
de uma antiga vila chamada Thermas. Para habitar a nova cidade, Cassandro transferiu
a população de muitas pequenas vilas do Golfo Termaico.
A nova cidade recebeu o nome em homenagem à sua mulher, Thessalonike,
irmã de Alexandre Magno, portanto, filha de Felipe II da Macedônia.
Thessalonike tinha nascido no dia da vitória de seu pai sobre os tessálios em 353 aC. Tessalônica, de
fato, significa “vitória dos tessálios”.
A cidade de Tessalônica ocupava um lugar privilegiado e estratégico no
mar Egeu. Estava situada no fértil vale do rio Vadar, protegida ao norte pelas
montanhas Khortiatis e aberta ao sul para o golfo Termaico. Seu porto era um
dos mais movimentados do mar Egeu. Distava 150 km de Filipos pela via
Egnatia que colocava em contato com a região do Épiro de um lado e com o
Bósforo de outro.
Na época de Paulo era, no dizer de Strabão, “a metrópole da Macedônia - a
mais populosa cidade”. O escritor romano Cícero, que se exilou ali de maio
a novembro de 58, escreveu: “Tessalônica
está situada no meio do nosso império” (as Atticum 3,19). O poeta Antípatro
(50 aC -
25 dC) nela nascido, a celebra como “Mãe
de toda a Macedônia”.
Em 168 aC,
os romanos conquistaram a Macedônia e a transformaram em Província Romana. Em
146 aC,
Tessalônica tornou-se a capital da Província Imperial da Macedônia. Nela,
morava, o procônsul romano, representante do imperador. Após a batalha de
Filipos em 42 aC,
obteve de Augusto o título de “cidade
livre”. Era administrada por uma assembléia popular eleita anualmente pela
população e por magistrados chamados “politarcos”. Como era costume na época,
somente os cidadãos nascidos em Tessalônica tomavam parte na vida democrática
da cidade. Os pobres, escravos, libertos e estrangeiros domiciliados (metecos)
estavam excluídos da organização da cidade.
No tempo de Paulo, Tessalônica era uma cidade de segunda grandeza no
império, pouco menor que Alexandria do Egito, Antioquia da Síria, Corinto,
Éfeso, Cartago e Lião nas Gálias.
Sua população era formada por grande número de romanos e gregos, e
caracterizada por fortes contrastes políticos-sociais. De um lado os
comerciantes e armadores vindos de todas as partes do império, com todos os
direitos e de outro a grande massa de pobres. Os escravos eram quase a metade
da população. Havia também uma numerosa e influente colônia judia, com sua
própria organização, com sinagoga, tribunal e conselho de anciãos e o
privilégio de “religião lícita”. No campo
religioso, havia em Tessalônica, como nas outra grandes cidades do Império
Romano, um grande sincretismo religioso.
A deusa principal da cidade era Nike – a deusa da vitória. Havia ainda
templos dedicados a Zeus ou Júpiter – pai de todos os deuses; Netuno ou
Posseidon – deus do mar; Ísis e Osíres – deuses do Egito e outros. Um dos
principais cultos era o de Dionísio – Baco, um dos cultos de mistério com
fortes ligações com a vida pós-morte. De fato, uma das tribos deslocadas por
Cassandro na fundação de Tessalônica, chamava-se Tribos Dionisias. As moedas da
cidade traziam a esfinge desse deus.
O culto do imperador também ocupava um lugar importante. Tessalônica se
orgulhava com o título de Neókoros,
concedido somente às cidades que tinham permissão de construir templos ao
imperador. O culto ao imperador era um modo de conservar o privilégio de cidade
livre. Os judeus sabiam disso e acusaram Paulo e seus companheiros de propor um
outro rei – Jesus (At 17,7).
Durante a conquista turca, a cidade passou a ser chamada Salônica, mas a
partir de 1937 retomou seu antigo nome de Tessalônica.
2. A Evangelização
A permanência de
Paulo na cidade não foi muito longa. At 17,2 fala de apenas três
semanas. Mas as cartas deixam supor alguns meses, de tal modo que Paulo teve
tempo de aplicar-se a um trabalho manual e material para assegurar sua
sobrevivência (lTs 2,9) e, ao mesmo tempo, constituir uma comunidade bastante
numerosa e formada sobretudo de pagãos convertidos (lTs 2,10) e com uma certa
"organização" (1Ts 5,12-13). Quanto à classe social dos cristãos, At
17,4 fala de “damas da sociedade” e 1Ts 4,11 fala em “ganhar o sustento com as próprias mãos”.
Baseados nesses textos, os exegetas falam de uma mínima percentagem de membros
da classe média e alta e a grande parte
de trabalhadores manuais, isto e, escravos, artesãos e pessoal do porto.
Como era seu costume, Paulo
dirigiu-se, em primeiro lugar, aos judeus e por três sábados ensinou na
sinagoga (At 17,2). Sua pregação teve certo sucesso (At 17,4). Mas uma
insurreição de judeus invejosos (At 17,5-10) obrigou Paulo e seus companheiros
a abandonar a cidade, indo para Beréia (At 17–10 ) e depois para Atenas (At
17,15ss).
De Atenas, Paulo enviou Timóteo a
Tessalônica (lTs 3,1) para sustentar a jovem Igreja. Parece que era desejo seu
ir pessoalmente à Tessalônica, outra vez. Mas algo que desconhecemos atrapalhou
seus planos.
Durante sua permanência em Tessalônica, os judeus,
provavelmente incitaram os pagãos contra Paulo e contra os neo-convertidos.
Sua partida da cidade não foi suficiente para serenar os ânimos. Os cristãos
eram ainda objeto de calúnias por parte dos judeus (lTs 3,6-10). Assim na impossibilidade
de ir pessoalmente, Paulo enviou Timóteo. Nesse ínterim, Paulo partiu de
Atenas, onde sua mensagem não foi bem recebida, para Corinto, onde Timóteo o
encontrara no seu regresso de Tessalônica.
3. As
Cartas
Segundo At 18,5 e lTs 3,6 as duas
cartas foram escritas durante a permanência de Paulo em Corinto, pelo ano
50/51, durante a sua segunda viagem missionária.
a) A primeira carta é fruto
da descrição, feita por Timóteo, da situação da jovem Igreja.
Esta
Carta não é somente a primeira em ordem de tempo, mas também o primeiro escrito
do Novo Testamento. No que se refere ao essencial da vida cristã, as notícias
eram boas. Os cristãos de Tessalônica permaneciam firmes na fé, esperança e
caridade. Sua fé tinha sido aprofundada por causa das dificuldades e das provas
encontradas (cf. lTs 1,3; 3,6-8). No entanto, a comunidade não tinha entendido
bem a doutrina sobre a Parusia, e se preocupava pela sorte de seus membros
mortos antes da vinda de Cristo (4,13). Isso gerava desvios morais, angústias,
tristezas e até ociosidade.
Assim
a carta de Paulo tem duplo objetivo:
- um encorajamento da fé dos cristãos e uma ação de graças por sua
operosidade (1–3);
- corrigir os desvios que surgiram na comunidade, sobretudo no que se
refere à sorte dos mortos na ressurreição e sobre a segunda
vinda de Cristo (4,13–5,10).
b) Os estudiosos que
defendem que a segunda carta também é de autoria do Apóstolo Paulo, afirmam que
ela foi escrita, provavelmente, alguns meses depois da primeira Carta e
praticamente tem o mesmo objetivo. Talvez as palavras de Paulo “nós os que estivermos vivos...” em lTs
4,15 tenham motivado ainda mais a preocupação de uma parusia iminente. O
Apóstolo procura desfazer tais idéias descrevendo os sinais que precederão a
vinda de Cristo (2,1-12) e exortando todos a se dedicarem ao trabalho
(3,10-12).
4.
Estrutura das Cartas
a) 1
Tessalonicenses – É dividida em duas partes:
1,1
|
Endereço
|
1,2 – 3,13
|
1ª parte: Agradecimentos e recordações
1,2-3 → agradecimento pela
fé, caridade e esperança dos
Tessalonicenses;
1,4-10 → ampliação do agradecimento: a resposta dos
Tessalonicenses â pregação de Paulo;
2,1-12 → Paulo retoma o agradecimento: a pregação de
Paulo
em
Tessalônica;
2,13-16 → confirmação do agradecimento: a resposta
dos
Tessalonicenses ao anúncio evangélico;
2,17–3,5 → o tempo do
afastamento: não podendo ficar em
Tessalônica,
Paulo enviou Timóteo;
3,6-13 →
retomada do agradecimento: Timóteo retornou
trazendo boas
notícias.
É uma grande ação de graças pela realidade da Igreja de Tessalônica. É
quase uma crônica emocionante, mas cheia de gratidão a Deus. Paulo lembra a
sua expulsão de Filipos, o encontro com os tessalonicenses, a acolhida do
anuncio do Evangelho, o período transcorrido na cidade, as dificuldades suas
e dos cristãos, a viagem de Timóteo e as boas notícias recebidas. E termina com
uma oração para que Senhor faça crescer sempre mais os tessalonicenses no
amor e na conduta irreprovável.
|
4,1 – 5,22
|
2ª parte:
Exortações e vários ensinamentos:
4,1-2
Introdução
4,3-8 → a
busca da santidade no amor;
4,9-12 → o amor fraterno;
4,13-18 → o destino daqueles que morreram;
5,1-11 → os tempos e o momento
do fim;
5,12-13 → os responsáveis da comunidade;
5,14-22 → exortações conclusivas.
|
5,23-28
|
Conclusão
|
Na primeira parte se nota a presença do binômio “nós-vós”. O “nós” dos missionários e o
“vós” dos tessalonicenses. Isso mostra a indiscutível comunhão que unia Paulo e
seus companheiros à comunidade de Tessalônica. O nexo dessa união é a aceitação
do anúncio de Jesus morto e ressuscitado. A participação nesse fato cria a
união entre os evangelizadores e os evangelizados. Essa união se dá pela
palavra acolhida e anunciada, a mesma fé e esperança. Nasce assim uma nova
união. Basta notar o freqüente uso do termo “irmãos” na carta (14 vezes).
Na segunda parte, prevalece os motivos de exortação, encorajamento,
instrução (4,10ss; 5,12). Aqui Paulo se mostra como guia da comunidade. Fala
com decisão, segurança e autoridade. Usa verbos no imperativo. Mas não se trata
de uma exposição fria de princípios morais. Paulo fala ao coração e procura
convencer. Percebe-se a consciência que Paulo tem de sua própria vocação
apostólica.
b) 2 Tessalonicenses:
1,1-2
|
Endereço
|
1,3-12
|
Agradecimento
e intercessão
1,3-5 → Fé e amor mútuo dos
tessalonicenses;
1,6-7 → Punição dos perseguidores;
1,11-12
→ Oração pela comunidade de Tessalônica
|
2,1-12
|
A
vinda do Senhor (Parusia)
2,1-2 → O dia do Senhor não é eminente;
2,3-5 → O fim será precedido da manifestação
do homem ímpio;
2,6-7 → Esta será porém impedida de um misterioso
obstáculo;
2,8-12 → Destruição do homem ímpio com todos os
seus adeptos.
|
2,13 – 3,15
|
Exortação
2,13-17 → Novo
agradecimento a Deus e exortação a manter as
tradições;
3,1-5 → Solicitação de orações;
3,6-15 → Repreensão àqueles que se comportam de
modo
indisciplinado.
|
3,16-18
|
Saudação
final
|
5.
Mensagem:
Alguns pontos importantes que
podemos concluir das duas cartas:
a) Temos aqui exemplo do que era o kerigma missionário, onde já se pode
perceber um sentido trinitário do anúncio. Insiste-se na adesão ao único e
verdadeiro Deus.
b) Pelas Cartas se pode perceber
também as dificuldades encontradas, os primeiros problemas que surgiram nas
comunidades e o modo como o Apóstolo tentou resolvê-los.
c) O Evangelho é verdadeiramente
“Palavra de Deus” (2,13). A 1Ts é o primeiro escrito do NT. Esta Carta não é
endereçada a pessoas, mas a uma Igreja (1,1). É o novo Israel que Deus amou e
escolheu (1,4; 2Ts 1,11).
d) É interessante a preocupação com
a Parusia e a Escatologia e as soluções propostos por Paulo.
e) Na comunidade percebe-se já a
existência de alguns ministérios, a quem Paulo recomenda o respeito (1Ts 5,12). Porém,
todos são instrumentos na mão de Deus (1Ts 4,9) e devem se ajudar mutuamente
(1Ts 5,14).
f) A oração é importante para o bem
da comunidade, que tem também os dons do Espírito (carismas). Os cristãos devem
ter o discernimento, porém não devem apagar o Espírito e não devem desprezar as
Profecias (1Ts 5,19-21).
g) Os cristãos devem esperar com
paciência à vinda de Cristo, portanto, devem trabalhar e inserir-se na vida
social, ganhando o pão de cada dia com o trabalho (cf. 2Ts 3,5-15). A história
humana prossegue o seu curso, sem que possamos estabelecer a data do seu fim.
i) Os temas trabalhados nestas duas
Cartas permanecem atuais. O anúncio da palavra é sempre novo. “Por esta razão é que sem cessar agradecemos
a Deus por terdes acolhido sua Palavra, que vos pregamos não como palavra
humana, mas como na verdade é, a Palavra de Deus que produz frutos em vós, os
fiéis” (1Ts 2,13). De outra parte, muitos são os que hoje anunciam a
Palavra com fins enganosos, anunciam ainda o “fim do mundo” (por ignorância ou
com objetivos econômicos), enganando multidões. Palavra de Deus é palavra que
produz a vida e não o medo!
Nenhum comentário:
Postar um comentário
* Caso o comentário seja contrário a fé Católica, contrário a Tradição Católica será deletado.
Queria dizer que...
Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.